quinta-feira, 4 de junho de 2015

Antes de ler e escrever, há muito para fazer

O que devem fazer as crianças antes e depois de entrarem no 1.º ciclo? Brincar, conviver, descobrir o mundo que as rodeia. É tempo de contactar com outros meninos e meninas, promover a socialização, saber estar, partilhar, ouvir e conversar.


Há muito para fazer e descobrir antes de ler, escrever e somar, considera Rita Castanheira Alves, psicóloga clínica especializada na área infantil e juvenil e de aconselhamento parental, autora de um projeto que está no site www.psicologadosmiudos.com, e que acaba de lançar o livro “A Psicóloga dos Miúdos”. Antes de entrar no 1.º ciclo, há competências a desenvolver e a estimular nas crianças. “Nos jardins de infância seguem-se diretrizes e planos normativos, mas há muito espaço para abordagens e perspetivas diferentes. Em casa, há pais que estimulam desde cedo umas competências em detrimento de outras”. Há muito para descobrir desde a nascença até à matrícula no 1.º ciclo. “Dar os primeiros passos no desafio de descobrir quem é, no aprender a ser pessoa, a distinguir-se dos outros, a criar uma individualidade, a sentir-se gostada e a saber gostar”, especifica.

Rita Castanheira Alves considera que é tempo de desenvolver competências a que chama “assuntos de toda a vida e mais além”, ou seja, capacidades e aprendizagens que serão a base para a vida real, no mundo, com os outros e consigo mesmo. “Esta fase é essencial para os pais e educadores ‘trabalharem’, de forma natural, no dia a dia, em brincadeiras e nas rotinas com a criança, a tolerância à frustração, a autoestima, a autoconfiança, a persistência, a solidariedade, a partilha, os limites e o saber errar e sem nunca esquecer, a literacia emocional, dando-lhes a possibilidade de conseguirem identificar em si, nos outros, expressar e regular as emoções, competência transversal para todas as aprendizagens que se seguem, seja na educação formal ou na vida além escola”, refere. 


Antes de se sentar na cadeira da escola, a criança dá os primeiros passos na autonomia e independência para que, desde cedo e de forma natural, se sinta segura, capaz de gerir os desafios que surgirão a qualquer momento. Na escola também. “Uma criança feliz, tranquila, competente pessoal, social e emocionalmente terá maior probabilidade de ter sucesso académico e estar preparada para os desafios mais formais da educação, porque serão também crianças mais motivadas intrinsecamente”.


Nesta fase, é importante criar desafios e situações adequados às características e fases de crescimento da criança para desenvolverem a sua capacidade de resolução de problemas. “Saber que pode ser difícil, mas que é possível tentar e no meio disto ajudá-la a saber errar, porque na escola irá errar para aprender. Como tal, saber acima de tudo errar, confrontar-se com o erro e com a nova tentativa e saber que isso faz parte da aprendizagem de todos nós, até dos pais”. “Ajudar a par do erro, a criança a arriscar, a compreender os riscos e a tomar decisões com os riscos que tem, seja numa simples escolha de duas hipóteses de brincadeira”.



Nos primeiros anos de vida, é fundamental experimentar, desenvolver competências artísticas, a agilidade motora. É tempo de contactar com outras crianças, jovens, adultos, desenvolver a socialização, saber estar e partilhar, ouvir e conversar. É tempo de brincar com meninos e com meninas, com bonecas, carrinhos, animais ou puzzles. “Nesta fase, a brincadeira com a criança é o maior motor de desenvolvimento de todas estas capacidades essenciais para o que se segue.” A brincadeira é um meio para tornar as aprendizagens naturais, descontraídas, fáceis, e eficazes, e ainda criar vínculos afetivos com a criança. 


A criatividade e a imaginação também têm um papel importante. “Ajudar a criar, a imaginar, seja por histórias, teatros caseiros, brincadeiras de tapete ou músicas”. “A criatividade é fundamental para a preparação da criança para a fase das aprendizagens escolares. Na fase pré-escolar, a criatividade de todas as formas é um grande recurso e um ingrediente que se pode usar bastante, a par com a curiosidade”. Ajuda-se a olhar para o que a rodeia, estimula-se o questionamento, responde-se quando pergunta, pergunta-se também, procuram-se respostas. 


Aprender e experimentar ser feliz. Saber escrever o nome, decorar letras, contar até 20 sem enganos poderá vir noutro tempo, quando o 1.º ciclo chegar. Rita Castanheira Alves considera que há muito para fazer antes disso. “Ou se calhar, com o foco e investimento nestas competências pessoais, sociais e emocionais, gradualmente e antes do 1.º ciclo, a vontade da criança em saber o seu nome, em aprender a contar e a mostrar sinais de que está preparada para a aprendizagem escolar aparecerá espontaneamente”. “Vale a pena tentar”, refere. 


Brincar é como respirar 

Até aos 6 anos, a criança encontra-se numa fase de acelerado desenvolvimento a vários níveis: físico, motor, social, cognitivo, emocional e linguístico. Desenvolvimento e aprendizagem andam de mãos dadas. As relações e interações que os mais pequenos estabelecem entre si e com os adultos, as experiências proporcionam novas aprendizagens, tudo isso contribui para o desenvolvimento. 


Para Cristina Parente, professora auxiliar do Departamento de Estudos Integrados de Literacia, Didática e Supervisão, do Instituto de Educação da Universidade do Minho, importa apreender quem é a criança. A criança quer conhecer e compreender o mundo que a rodeia, tem saberes e experiências e, por isso, faz perguntas e envolve-se em projetos para encontrar respostas para as suas curiosidades. A criança coloca desafios aos pais, à creche, ao jardim de infância, à comunidade. “Esta compreensão desafia os pais e os decisores a procurarem proporcionar as melhores oportunidades de aprendizagem e desenvolvimento, desde cedo às crianças, tendo como referência a necessidade de educar cada um até ao limite das suas possibilidades, procurando, ao mesmo tempo, conseguir a integração de todos.” 


A criança cresce, aprende, desenvolve-se através de interações que estabelece com as pessoas que a amam, que cuidam dela, que lhe dão segurança, que estão atentas às suas características e que a desafiam. “De facto, o processo de educação da criança ocorre num continuum entre os contextos de educação não formal e os contextos de educação formal, entre os quais se destaca e família e os contextos de educação de infância”, refere Cristina Parente. 


“Naturalmente que a criança constrói muitas aprendizagens e se desenvolve nos contextos da educação informal através dos processos de socialização nas relações intrafamiliares e extrafamiliares. Mas este tipo de resposta, por si só, parece não ser suficiente tendo em conta as muitas solicitações das famílias e os limitados apoios na sociedade atual urbanizada, globalizada e multicultural. O contexto da educação de infância emerge como uma alternativa mais consistente e integrada para, em colaboração com as famílias, responder ao desafio da educação das crianças pequenas”, sublinha a professora do Instituto da Criança da Universidade do Minho.


Segundo Maria José Araújo, professora da Escola Superior de Educação do Porto, nos primeiros anos de vida, e não só, é importante brincar, criar condições para que as crianças brinquem. “Brincar é muito importante em todas as fases da vida, mas nesta fase é fundamental. Para a criança é como respirar”, garante. A socialização também tem uma palavra a dizer. “É com o grupo de pares, com outras crianças, que criam e recriam as culturas da infância”. “É fundamental conversar com os filhos e garantir uma instituição de pré-escolar que valorize o brincar e o diálogo”, sublinha. 


Os pais devem, na sua opinião, saber respeitar os tempos e os ritmos das crianças e compreender que brincar garante equilíbrio e bem-estar. Há um erro que convém evitar: há pais e encarregados de educação que procuram no pré-escolar conteúdos do primeiro ano do 1.º ciclo. “A escola é muito importante e é por isso mesmo que antes de entrar para o 1.º ciclo do Ensino Básico, mas também durante, o mais importante é criar condições para que as crianças brinquem”. 


É preciso, sublinha, valorizar as brincadeiras das crianças como elementos essenciais de relação com a natureza e com a cultura do mundo adulto. Ao longo da vida, precisam de atividades equilibradas. “As crianças aprendem regras de cooperação e respeito brincando. É essencial que os educadores compreendam isso e valorizem”. Brincar é, afinal de contas, um direito. “O brincar e as brincadeiras, enquanto manifestações coletivas, ajudam a criança a desenvolver relações sociais com o seu grupo de pares e com os adultos, apelando à memória coletiva”, realça Maria José Araújo

in: Educare

Saiba porque é que brincar é a melhor coisa que os miúdos podem fazer

Brincar pode prevenir doenças como a hiperactividade. 
O neuropediatra Nuno Lobo Antunes diz que é “um alimento essencial.

Têm uma energia inesgotável e às vezes era bom que tivessem um botão de desligar. Travar as brincadeiras das crianças, contudo, pode dar mau resultado. Especialistas ouvidos pelo i avisam que esta é das principais ferramentas de aprendizagem na infância, mas também pode permitir diagnosticar problemas de desenvolvimento. Uma equipa de investigadores de Coimbra defende mesmo que apenas dez minutos de brincadeira por dia podem prevenir problemas como hiperactividade.

Hoje assinala-se o Dia Mundial da Criança, pretexto para perceber a importância daquela que é a actividade nobre dos mais novos.

Para o neuropediatra Nuno Lobo Antunes, director do centro para as perturbações do desenvolvimento – Progresso Infantil (PIN), não há dúvidas: a brincadeira é um “alimento absolutamente essencial no desenvolvimento cognitivo”. Começar cedo a brincar é o mais natural, acrescenta também o pediatra Mário Cordeiro. Segundo o especialista, é mesmo entre o primeiro ano de vida e os cinco que a brincadeira tem mais significado na vida dos pequenos. “A criança deixou de ser ‘bebé’ e ainda não é um ‘aluno da primária’. Brincar é, assim, a sua principal função e será através da brincadeira espontânea ou do jogo mais estruturado, só ou com outros meninos, que aprenderá a utilizar uma linguagem e comunicação cada vez mais simbólicas, organizadas e amplas”, diz o médico.

Logo a partir destas idades, é o brincar que facilita a aquisição de conhecimentos, o equilíbrio de tensões e a catarse de emoções e sentimentos difíceis. Mário Cordeiro salienta ainda o “gozo puro e simples do prazer físico, psicológico e emocional” que a brincadeira provoca. Pode ser tentador para os pais mostrarem às crianças aquelas que eram as suas brincadeiras preferidas, mas há uma regra que Mário Cordeiro considera importante: respeitar a vontade da criança. Na opinião do especialista, deve-se promover algum equilíbrio, por exemplo entre brincar com outros ou brincar sozinhos, mas respeitando sempre a personalidade e unicidade de cada um.

Importante até que ponto? De acordo com um projecto de investigação da Universidade de Coimbra, o assunto é mesmo sério: brincar dez minutos por dia parece reduzir os riscos de distúrbios comportamentais como hiperactividade, défice de atenção e agressividade. As autoras da iniciativa “Anos Incríveis” têm-se dedicado a estudar este tipo de problemas e a mais-valia das interacções entre pais e filhos, e defendem o conceito de parentalidade positiva como uma das estratégias para ter ganhos a longo prazo.

A brincadeira é central nesta dinâmica e, segundo as investigadoras, ideias como os adultos respeitarem as regras dos mais pequenos e entrarem no “jogo” podem mesmo traduzir-se em ganhos nas duas direcções. Ao mesmo tempo que as crianças desenvolvem capacidades e exploram a criatividade, há um reforço dos laços parentais.

Se estas ideias alimentam o projecto que pretende implementar a “disciplina” da brincadeira pelo país através de formações com pais, educadores e crianças, e que recentemente recebeu financiamento europeu, Nuno Lobo Antunes considera que é preciso ter alguma cautela. Para crianças que já tenham um diagnóstico de hiperactividade, dez minutos de brincadeira não devem ser encarados como “remédio”, já que precisam de ajuda especializada.

Por outro lado, o médico frisa que embora a brincadeira seja importante para o desenvolvimento infantil, não se podem atribuir distúrbios comportamentais à falta da mesma, já que existem múltiplas causas. E a solução passará sempre pela busca de competências, que pode ter de ir além do jogo.
Há ainda outros avisos. Uma criança que não tenha desenvolvido competência para brincar com outras crianças vai sentir-se pior se for “obrigada”, diz o neuropediatra. É que, embora o brincar seja quase que um reflexo natural para a maioria das crianças, não o é para todas. E na opinião do médico, mais do que a chave para todos os problemas, deve encarar-se a brincadeira como um indicador dos mesmos. É através da brincadeira – ou da falta dessa apetência – que se detectam os primeiros sintomas de doenças como o autismo ou a hiperactividade, exemplifica. No primeiro caso, as crianças não conseguem desenvolver o jogo simbólico (o “faz de conta”). No segundo, há dificuldade em interagir com outras crianças.

Brincadeira 2.0 E será que a tecnologia veio ajudar ou prejudicar? Para o director do centro PIN, Nuno Lobo Antunes, as brincadeiras de hoje não são necessariamente piores que as de antigamente. “A tecnologia proporciona oportunidades incríveis, as crianças querem pesquisar algo sobre algo e têm as respostas na ponta dos dedos”, afirma. Já Mário Cordeiro tem uma visão mais crítica, sobretudo nas idades pré--escolares: não chega ter o “pronto-a-comer” dos gadgets e da electrónica, sublinha. “Seria como um grande chefe de cozinha aprender a cozinhar fazendo uma simples torrada com manteiga”, diz.

Para o médico, cada vez mais se prova que o uso de tablets e videojogos até aos cinco anos é “inadequado, uma prática errada e contraproducente” que limita a criança, “castrando-lhe a criatividade e, principalmente, o uso dos cinco sentidos e o desenvolvimento físico, limitando o processo de relacionamento entre a criança e o ambiente, quer o físico, quer o humano”. Todas as brincadeiras que fomentem a atenção, estratégia, raciocínio, criatividade, imaginação e uso de “peças toscas” para criar um jogo e construir o processo de brincar dão, na opinião do médico, melhor resultado. Ajudam a combater a dispersão, a overdose de estímulos e o cansaço psicológico e intelectual. “Tudo o que seja confrontar a criança com a natureza será bom, desde que seguro, e tudo o que seja artificial, embora necessário no quotidiano, é cansativo e exige um esforço cerebral adjacente, com tudo o que isso implica”, remata.

Todos os livros de Michel Foucault para download gratuito

Nesse site do grupo de estudos foucaultianos, todos os livros do filósofo francês estão disponibilizados para download gratuito, assim como livros de comentadores e leituras introdutórias.
https://bibliotecaucs.wordpress.com/2013/11/05/todos-os-livros-de-michel-foucault-para-download-gratuito/

BE quer estudo epidemiológico sobre hiperatividade e normas para prescrição de medicamentos


O Bloco de Esquerda propôs hoje ao Governo a criação de uma norma de orientação clinica (NOC), para a prescrição de medicamentos contra a hiperatividade, e a elaboração de um estudo epidemiológico sobre a prevalência e incidência desta perturbação.
A sugestão surge a propósito da controvérsia que envolve o aumento dos casos diagnosticados e da medicação de crianças e adolescentes com perturbação de hiperatividade com défice de atenção (PHDA), nos últimos anos.
O tratamento medicamentoso da PHDA passa pela administração de Metilfenidato, aprovado em Portugal desde 2001, ou de Atomoxetina, que passou a ser coparticipada em 2014, ambos os medicamentos classificados como estimulantes inespecíficos do sistema nervoso central.
in: Destak 02 | 06 | 2015   17.28H